Aparentemente os conceitos de trabalho e liberdade são facilmente entendidos, todavia a relação entre trabalho e liberdade implica a clarificação da relação entre ambos.
Poderíamos fazer várias abordagens e todas teriam a sua razão de ser, mas optei por abordar esta relação na ideia de que a liberdade e o trabalho deveriam existir num equilíbrio saudável entre o referido trabalho e o ócio criativo.
Entendo por ócio criativo todas as actividades que nos dão prazer, nas quais nos envolvemos física e afectivamente, proporcionando-nos alegria de viver. Muitas vezes o trabalho pode confundir-se com esse ócio mas convém fazer a distinção para criar o tal espaço de liberdade.
A Gulbenkian organizou uma exposição comissariada por Jorge Calado, sobre o trabalho de Maria Lamas, Mulheres da minha Terra. Nessa exposição podemos ver em fotografias de pequeno formato os registos de variadas mulheres que Maria Lamas foi fazendo, percorrendo todo o país e ilhas entre 1948 e 1950. Essas fotografias transmitem-nos nos rostos e olhares dessas mulheres a dureza dessas vidas, gastas em trabalho que se acumulava com o trabalho da lida da casa e do cuidar dos muitos filhos que cada uma em geral tinha. Trabalho mal remunerado que não permitia folgas.
Que liberdades teriam estas mulheres prisioneiras da sua condição de mulheres do povo trabalhadoras?
No semanário Expresso, surgiu há semanas a notícia de que 251 mil trabalhadores acumulam dois ou mais empregos. Neste universo encontram-se sobretudo as pessoas com mais habilitações académicas. Todas estas pessoas, caso fossem bem remuneradas, teriam tempo para ócio criativo mas nestas condições onde têm a sua liberdade se estão reféns das contas para pagar?
A palavra inglesa “workaholics” entrou no nosso léxico. Estas pessoas trabalham compulsivamente e não conseguem desligar-se do trabalho em prejuízo da sua vida familiar e social. Prisioneiras por compulsão, onde está a sua liberdade?
E quem terá maior liberdade, o trabalhador por conta de outrem ou por conta própria? Ou essa questão não é relevante?
Conhece-te a ti mesmo, frase lapidar, poderá, talvez, ajudar cada um a encontrar esse equilíbrio entre o trabalho e a sua liberdade se estiver disposto questionar-se, a avaliar os seus valores e a fazer as mudanças necessárias, o que nem sempre é possível e será sempre doloroso. Sair do conhecido para o desconhecido, forçosamente incerto, não se faz de ânimo leve.
Idealmente deveríamos gostar e encontrar um sentido no trabalho em que empregamos tantas horas e energia das nossas vidas. Esse trabalho, sendo gratificante, deveria em simultâneo proporcionar-nos condições financeiras para termos uma vida equilibrada onde o ócio desempenhasse igualmente um papel relevante. Questionar-nos se é exatamente isto que temos e se podemos fazer diferentes escolhas é fundamental. Aí está a nossa liberdade em relação ao trabalho.
Para alguns haverá essa possibilidade, para outros não.
Dolores Cortés